quinta-feira, 26 de junho de 2008

O drama de viver no corpo errado

O drama de viver no corpo errado

Cirurgia que será oferecida pelo SUS é tida como a única saída para o transexualismo
Paulo Marcio Vaz

Em 2004, numa tentativa desesperada de se livrar do que sempre considerou um corpo estranho no seu jeito feminino, a atriz, poetisa e webdesigner Maite Schneider comprou um bisturi, certa quantidade de anestesia de dentista, mais alguns apetrechos e ligou para um amigo, enfermeiro da Santa Casa de Curitiba: "Se eu não te ligar em 30 minutos, vem me socorrer", disse. Não deu outra. Trinta minutos depois, o enfermeiro cumpriu o combinado. Ele encontrou Maite desmaiada, em meio a uma poça de sangue. Sua tentativa de retirar, sozinha, os próprios testículos, é claro, não deu certo.

O drama de Maite, que nasceu Alexandre, mas, desde criança se sente mulher, é o que os médicos chamam de transexualismo ou transtorno de identidade de gênero, patologia que já levou muitas pessoas ao suicídio e cuja solução é a cirurgia de mudança de sexo, procedimento que o Ministério da Saúde anunciou como a próxima atividade a ser coberta oficialmente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Há cinco meses, Maite conseguiu se submeter, com sucesso, à cirurgia. Mas, até então, o inconformismo com seu corpo masculino teve mais capítulos dramáticos. Ainda em 2004, recuperada, mas angustiada por não ter se livrado dos testículos, ela foi a uma clínica clandestina no Paraguai. Voltou sem testículos, mas com uma infecção generalizada que se manifestou dias depois. Recuperada novamente, Maite finalmente tomou a decisão certa: procurou um cirurgião que pudesse realizar a cirurgia de troca de sexo, em 2006. A operação foi feita em São José do Rio Preto, interior de São Paulo, mas um tumor pós-operatório obrigou-a a refazer parte da cirurgia.

A nova tentativa foi em Jundiaí, também no interior de São Paulo, desta vez com o cirurgião Jalma Jurado, considerado um dos pioneiros e maiores especialistas do Brasil em cirurgias de mudança de sexo. Finalmente, tudo deu certo.

– Desde quando eu era criança, sempre me soube mulher e não conseguia entender como não era. No colégio, por exemplo, não sabia porque tinha de ficar na fila dos meninos, se, na minha concepção, eu era menina – lembra Maite.

Troca de nome
Depois de encontrar harmonia entre corpo e espírito, Maite trava uma nova batalha: tenta mudar, na Justiça, seu nome e condição sexual, numa via crucis demorada, burocrática e incerta quanto ao êxito do resultado.

– É incrível como a Justiça brasileira ainda não atentou para este problema. É muito cruel ser mulher e ainda ter de me identificar como Alexandre em situações como eleições, embarque em aeroportos e inúmeras outras – afirma. – É sempre um transtorno, uma confusão, uma falta de respeito.

Melhor sorte – e juízo – que Maite teve a secretária Maria Augusta Silveira, a Guta, que há 10 anos foi submetida à mesma cirurgia, na época, a terceira realizada no Brasil. Além de ter conseguido trocar de nome em "apenas" seis meses, ela não cometeu qualquer loucura antes da operação. O testemunho de Guta a respeito de como ela se sentia antes da trocar de sexo é bem parecido com o de Maite:

– Desde os 3 anos eu já sabia que era diferente. Quando era criança, olhava para as mulheres e tinha certeza que meus seios iam crescer – lembra Guta. – Da mesma forma, acreditava que meu pênis cairia sozinho e eu, então, viraria mulher. Nunca me senti homem.

Saúde pública

O terapeuta sexual Amaury Mendes Jr. é um dos especialistas que atendem a transexuais que se candidatam à operação de mudança de sexo no Rio. Ele enfatiza que o transexual não deve ser confundido com o homossexual, salientando que são casos bem diferentes.

– O homossexual não quer mudar de sexo, mas apenas se relacionar com pessoas do mesmo sexo. Já o transexualismo é um transtorno e deve ser tratado. O transexual não consegue se ver como pertencente ao sexo com o qual nasceu e sente-se como se estivesse vivendo no corpo errado – explica Amaury. – A saída é a cirurgia. Para quem não consegue ser operado, o sofrimento é muito grande e casos de automutilação e suicídio são comuns.

fonte: http://jbonline.terra.com.br/

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