segunda-feira, 1 de outubro de 2007

Afeminado? Tô fora!

Conto publicado originalmente no Portal Angel Loiro
"Não sou afeminado. Nem curto... Não gosto de afeminado para relacionamento, pois eu não sou. Para amizade... tudo bem... blá...blá... blá..."
Acima estão alguns dos famosos comentários anunciados nas mensagens de sites de encontros. Vemos as mesmas frases pipocarem na tela das salas de bate-papo.
Contarei uma breve historinha real: Era uma tarde de tédio mortal. Eu estava teclando no chat do Terra. Minutos depois que entrei, um sujeito puxou papo. Ao ver o meu nickescalafobético (peludíssimo_sp), foi logo perguntando:
"Você é afeminado?". Minha resposta: "Não. Eu não sou." Percebi que a conversa prometia. "Puxa, que bom", ele disse, "pois eu não curto cara afeminado.
"Nossa conversa engatou. Ele era médico e morava em São Paulo. Disse que era bem sucedido, lindão, experiente, bem vivido (é engraçado como todos são perfeitos atrás de um monitor!) e... solitário.
Apresentei meu currículo padrão. Trocamos nossas afinidades triviais (gostávamos de cinema, teatro, caminhadas, cachorros, viagens e leitura).
Após vinte minutos de conversa, houve troca de números de telefones e de fotos por e-mail. Pela foto ele aparentava ser simpático. "Lindão" era um pouco demais.
Saímos do chat. Conversamos ao telefone. A voz imposta do médico era de derreter corações. Um misto de Francisco Cuoco (voz) com Reinaldo Gianechini (sensibilidade).
Fiquei de peepo duro na hora!
Combinamos um encontro no Conjunto Nacional, localizado na av. Paulista, em SP, para dali a dois dias. Eu estaria na capital à trabalho e assim uniria o útil ao (des)agradável encontro - você irá entender os motivos mais adiante!
Na data, local e hora combinada eu esperava o possível novo amigo. Ele chegou três minutos atrasado. Estava elegante e muito bem vestido, mas os litros de Azzaro que ele derramou no corpo todo sufocaram um pouco meus neurônios nos primeiros cinco minutos de conversa. Passeamos pelo local, depois fomos almoçar num restaurante próximo.
Notei que ele se esforçava demais em parecer "masculino". Todos os movimentos eram previamente estudados. Todas as palavras que saíam de sua boca eram frases feitas. Bem diferente do sujeito que eu havia teclado dias atrás.
Percebi que não passaríamos de possíveis amigos, já que não houve de imediato uma química sensual (não confunda com "desejo de trepar") pelo menos de minha parte.
Nossos mundos eram muito diferentes.
Não haveria equilíbrio, pois ele não estava disposto a mudar um milímetro sequer de sua existência em benefício do nosso possível relacionamento. Eu é que teria que me adaptar ao seu modo de vida. Subimissão gratuita... jamais!
Na hora do cafezinho o médico entregou o ouro. A maneira com que ele colocou o adoçante na xícara, misturou o café com a colherinha e o sorveu logo em seguida, com dedinho em pé e tudo mais era digno de figurar numa cena da Gaiola das Loucas!
Logo em seguida, ao chamar o garçom para acertarmos a conta, vi bem na minha frente o bracinho esticado, o dedinho indicador para cima e a voz em falsete tentando chamar a atenção do rapaz franzino. Uma cena triste e hilariante ao mesmo tempo.
Para terminar, nas duas horas em que estivemos juntos, o sujeito perguntou-me 737 mil vezes se eu não era afeminado!!! Pôxa, ele estava ao meu lado. Será que não dava para perceber como eu me comportava?
O seu medo em "dar bandeira" era tanto, que bastou pouco tempo para eu perceber o porquê de sua solidão. Não dava para ter uma vida social com aquele sujeito.
Acompanhei meu médico lindão até seu carro, um Audi prata (esse sim... lindérrimo!). Eu não era o companheiro indicado, pensei. Acredito que ficaríamos eternamente presos em seu suntuoso apartamento nos Jardins (palavras dele), vendo filmes em DVD em sua sala de home teatro (também palavras dele) pelo resto de nossas vidas!
- Eu quero mais é viver! -
Moral da história: muitas vezes ao não aceitarmos nossos próprios limites e defeitos, projetamos nos outros aquilo que repudiamos em nós mesmos. Dizemos: "não, não e não"para as coisas que acreditamos não possuir dentro de nós e crucificamos o próximo, apontando a todo momento os defeitos alheios.
Somos preconceituosos e isso é um fato. No íntimo, em algumas situações, invejamos àqueles que vivem sua sexualidade naturalmente e não somos humildes o suficiente para utilizar a experiência e a vivência dessas pessoas em benefício próprio. Temos medo da liberdade!
Ser "afeminado" é muito diferente de ser "afetado". A primeira opção pode ser uma característica natural e "normal" em qualquer ser humano. Conheço homens que são um poço de sensibilidade e carinho e isso não afeta em nada a sua virilidade.
A segunda opção é algo que algumas pessoas criam para si mesmas. Fazem questão de expor ao mundo um certo sensacionalismo próprio, desejando a todo custo chamar a atenção conscientemente, usando muitas vezes o já batido e infeliz estereótipo típico do viado, da bicha louca – tá ai as Pocotós da vida que não me deixam mentir (e o que é pior: faturando horrores!)Esses seres acreditam que isso serve como defesa perante a sociedade. Um comportamento do tipo: "já que sou gay mesmo... deixa eu esculhambar!
"Pare e reflita. Para que gastar tanta energia em ficar se policiando, sendo que se você aproveitasse essa mesma energia para coisas mais dignas e úteis em sua vida a satisfação e realização pessoal seriam algo indescritível!
Aprenda a viver plenamente e a "neurotizar" menos o seu comportamento. Delicado, afeminado, troglodita... não importa. Respeite os limites dos outros e mostre a eles o caminho para que respeitem a sua maneira de ser e de viver. Tudo é muito simples. Basta, novamente, dar o primeiro passo. E isso somente você será capaz de fazer.
PARA LER OUTROS CONTOS DE MOÁ SIPRIANO
ACESSE O PORTAL ANGEL LOIRO



angelloiro.com

Um comentário:

Anônimo disse...

é a primeira vez que visito este blog e dei de cara com esta mensagem. lendo esta mensagem vi um reflexo do que também penso!parabéns pelo excelente texto tao esclarecedor e pela energia tao positiva! durval